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quarta-feira, 21 de maio de 2014

UM BOM VIZINHO

                                                 CAPÍTULO 6

XV

  O resultado do telefonema que Mário Regino fez para o doutor Pacheco, e o que veio depois, só foi saber quando viu por acaso um colega de Rodrigo da empresa, um tal de Hermes, na esquina da rua do Carmo com a Sete de Setembro; e como Mário Regino não via Rodrigo a dias, nem no centro da cidade e nem no prédio, perguntou por ele. Quando Hermes narrou em detalhes o que houve no trabalho, as palavras que ouviu soaram como néctar:   
 - Você nem imagina o que aconteceu lá, Mário!Foi uma baita confusão! Só ontem que Rodrigo deu as caras, e ainda por cima, veio com uma desculpa esfarrapada por sua ausência no escritório nesses dias todos. Falou pra gente que estava passando por uma crise no casamento, e vê só o descaramento dele, ainda inventou que sua esposa perdeu a criança por causa da Glorinha, você sabe quem é, foi a secretária dele. Ele tava possesso, soltando fumaça pelo nariz, e ficou procurando Glorinha pelas salas! Nisso quem aparece? O doutor Pacheco, que quando o viu zanzando nas salas, o chamou de ladrão e traidor na frente de todo mundo! Aí que ficamos sabendo que o Rodrigo havia passado uns projetos confidenciais pro concorrente. Num estado completo de paranoia, ele gritou que tudo era mentira, que o dr. Pacheco queria destruir a vida dele e da sua mulher! Coisa mesmo de maluco! Olha como são as pessoas, Mário...Rodrigo sempre ficava na dele, sempre simpático, que cativava a galera pelo papo. Isso quando tava sóbrio, o resto era tudo fachada. Dr. Pacheco mandou que ele fosse embora, mas Rodrigo gritou que não ia sair, não sem antes falar com Glorinha. A coitadinha se escondeu na sala do doutor Pacheco. Ela disse pro doutor que estava sendo assediada sexualmente por Rodrigo. Os figurões da empresa queriam aliviar a barra, tipo não chamar a polícia pra não manchar o nome da empresa... Mas a coisa fedeu mesmo quando Rodrigo descobriu onde Glorinha estava, e aí os seguranças entraram, mas Rodrigo conseguiu escapar deles pulando de mesa em mesa, até que se jogou em cima do doutor Pacheco e meteu a porrada no cara. Foi um separa aqui e ali, os seguranças o pegaram, um deles deu uma gravata pelo pescoço e foram arrastando ele, se debatendo todo, para fora do prédio. Acha que depois disso ele desistiu? Que nada, ainda ficou de plantão na portaria, dizendo que enquanto não falasse com Glorinha não arredaria pé de lá. E nisso veio a polícia. Mais uma vez ele resistiu, foi algemado e o levaram para a DP. Ontem no bar do Augusto; encontrei ele entornando todas e jurou que é inocente. Fingi que acreditava nele, mas te digo, cheguei a ficar com pena do cara. Esse já era no mercado, tá acabado. Me tomou como seu ouvinte, e ficou desfiando um rosário de lamentações, falou que sua mulher não queria mais nada com ele, que foi demitido por justa causa, fora que vai ser processado por evasão de confidencialidade. Me disse que era coisa do Pacheco, que o doutor armou tudo para prejudica-lo. Sei que Rodrigo vai sumir da área por um bom tempo. Emprego bom para ele vai ser quase impossível, qual grande empresa vai contratar um ladrão? A fama espalha rápido, principalmente quando a fama é má! Do jeito que ele falava, pensei até que ia acabar fazendo uma bobagem do tipo, "vou matar uma pessoa ou vou estourar meus miolos". Que coisa, hein, esse cara tinha tudo pra ter sucesso , mas por causa da ganância, botou tudo pra perder!
 "Ganância não é a palavra certa - pensou Mário Regino, extasiado com que ouvira. - Arrogância que é a palavra certa. Moleque arrogante."

XVI

 No dia da mudança dos móveis do apartamento 802, Samanta pediu que seus irmãos orientassem os funcionários do caminhão baú. Ela continuava na casa de seus pais se recuperando do aborto espontâneo. Rodrigo, por várias vezes tentou falar com ela, sem sucesso, todas vezes foi impedido pelos familiares dela, principalmente pelos irmãos, que ameaçavam sua integridade física.
 Mário Regino abriu a porta do seu apartamento e viu o da frente vazio, pelas paredes nuas só haviam quadrados escurecidos onde antes quadros enfeitavam a sala; no lugar da estante e da TV de plasma, só cabos soltos. O chão de assoalho antes lustroso, agora arranhados; as gargalhadas e as histórias contadas pelo jovem ambicioso e bem-sucedido profissionalmente, agora era silêncio e melancolia.
 Mário Regino balançou a cabeça. Parecia consternado com tudo aquilo.

 Só aparência; seus olhos porcinos brilhavam satisfeitos.

CONTINUA
E no último capítulo ( Um encontro casual )

Rogerio de C. Ribeiro

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