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quinta-feira, 17 de julho de 2014

O PRÊMIO CAPÍTULO 29

No capítulo anterior: E foi assim em todo bairro. Ela passou em várias bancas de jornais e em cada uma delas comprou dezenas de pacotes. Mônica olhou o dinheiro que sobrara e decidiu fazer uma pausa.
Deu seu endereço e o táxi partiu para a zona norte. Quando o carro estacionou na esquina da sua rua, Mônica disse:
- O senhor pode parar aqui mesmo...
Ela pagou a corrida e depois atravessou a rua. Quando entrou em casa, eram quatro horas da tarde.

Capítulo 29

Felipe e Mateus estavam na sala, cada um fazendo seus deveres de casa. Quando viram sua mãe entrando, gritaram ao mesmo tempo:
- Manhê! Onde a senhora foi?????
- Larga de serem escandalosos! - Mônica disse. - Tão parecendo duas mariquinhas!
O rosto de Felipe mostrava preocupação:
- Mas manhê, a senhora nunca saiu de casa assim, sem que tivéssemos voltado da escola...
- Sempre existe uma primeira vez para tudo - Mônica caminhava para a cozinha. - Tem que agradecer, ainda fui boazinha de não ter trancado a porta.
- Isso é outra coisa estranha - murmurou Felipe.
No meio caminho, Mônica estancou e virou-se para eles:
- Estranho porquê?
- Nada, mãe, esquece...
(Os meninos estão desconfiados, Mônica... Toma cuidado com esses pestinhas senão tudo vai pro buraco!)
 - Agora que começou, tem que acabar, Felipe - disse Mônica de forma ameaçadora. Ela largou sua bolsa de tiracolo com mais de mil pacotes de figurinhas dentro dela em cima da mesa. - Nestes últimos dias venho percebendo que você tá de conspiração pra cima de mim...
- Eu não! - Felipe se defendeu.
- E nem eu - disse Mateus.
Mônica abriu a mão, como se fosse bater no seu filho de sete anos e gritou:
- Essa conversa não chegou ainda pra você, seu linguarudo!
Ela voltou-se para Felipe:
- Vamos abrir o jogo agora, Felipe... o que tá acontecendo com você? Não gosta mais da sua mãe?
- Eu gosto... amo!
- Não é o que parece... Tá com jeito que me odeia e quer que eu me ferre toda!
- Não!
(Esse moleque descobriu onde as outras figurinhas estão escondidas! Eles pensaram que a porta da frente estava trancada e entraram pela área de serviços... como ele encontrou a sacola com as figurinhas repetidas, vasculhou tudo pra ver se achava mais... e achou dentro da máquina de lavar!)
Mônica não podia acreditar... mas olhando para o rosto sonso do seu filho mais velho, também não podia descartar essa possibilidade...
- Eu já sei qual é a sua, Felipe...
Apavorado, Felipe largou o lápis em cima do caderno e disse, chorando:
- Manhê... eu não fiz nada, não contei nada...
- Mentiroso! - Mônica gritou e soltou um tabefe no rosto do menino. Felipe, que estava sentado na mesa fazendo o dever de casa, assim que levou o tapa, caiu estatelado no chão, chorando. Mateus, em outra cadeira, correu para o seu quarto. Mônica não estava preocupada com Mateus, agora seu problema era Felipe.
- Escute só o que vou te falar, e preste bastante atenção porque não vou repetir... - Ela sentia seu coração disparando e sua cabeça estourando de dor. Uma pequena hemorragia escorria das suas narinas, mas ela nem notou. Quando voltou a falar, sua voz era arrastada:
- Estou dando um duro danado pra merecer o prêmio! Esse prêmio que foi criado para mim, só pra mim! Não vou permitir que ninguém, mas ninguém mesmo, principalmente um fedelho como você, me dê uma rasteira para tomar o que é meu de direito!
Chorando e com as faces ardendo, Felipe disse:
- A senhora está doente, manhê...
- Vocês que fazem que eu fique doente! Sempre atendi aos seus desejos egoístas, nunca reclamei de nada... Agora que tenho a chance de ser eu mesma, não vou deixar que me passe a perna.
- Em quê?
(Ele vai te enrolar, Mônica. Vai dizer que não sabe de nada...)
 - Eu não sei de nada!
(... e que é leal...)
- Nunca te traí, manhê!
(...que entrou pela porta da frente...)
- Eu e Mateus vimos que a porta estava aberta e entramos!
(... que não falou com o pai do álbum...)
- Não falei com papai do álbum...
(E o máximo dos máximos! Não tem a menor ideia desse prêmio!)
- E nem sei que prêmio é esse!
Mônica ficou confusa com as informações que ia recebendo. Seus lábios agora eram de um vermelho vivo, como se tivesse borrado com batom. Ela não sentiu nenhum gosto de sangue, mas a dor de cabeça intensificava cada vez mais.
Sentiu uma fraqueza e caiu arriada na cadeira. Felipe aproveitou para fugir dela. As mãos dela tremiam, a palpitação no peito acelerou.
"É meu filho... não consigo..."
(COVARDE!)
"Não posso... acredito nele..."
(IDIOTA!)
Mônica precisava tirar as dúvidas que atormentavam sua cabeça. Foi para a área e abriu a máquina de lavar. A sacola abarrotada de figurinhas repetidas continuava no mesmo lugar.
Tirou da bolsa que tinha pendurada no ombro os pacotes de figurinhas que comprara pela cidade e jogou-as dentro da máquina, que caíram espalhadas.
"Depois eu pego e junto tudo!"
Escutou a porta da sala abrindo e foi até lá; Adroaldo trazia Daniel no colo, e parecia chateado.
- Quase quatro horas para ser atendido! - disse Adroaldo depois que deixou Daniel no sofá. - A saúde pública tá cada vez pior!
- E o que ele tem? - Perguntou Mônica.
- Fizeram um exame de sangue nele e o resultado sai na semana que vem. O pediatra não soube explicar direito qual era o problema dele. Pra dizer a verdade, ele mal olhou pro nosso filho.
Mônica se jogou na cadeira. Esperava mais um discurso dele. No fundo era até bom; se ficasse um pouco sentada, sem fazer nada, talvez diminuísse a sua enxaqueca. Ao mesmo tempo que tirava os sapatos e as meias, Adroaldo narrava as peripécias em um posto de saúde - Mônica quase soltou uma gargalhada quando criou o título para o monólogo do seu marido.
- Mônica, você não imagina como fica lotado uma emergência pediátrica. Mesmo pagando a consulta do Daniel, tivemos que esperar quase quatro horas para ser atendido! E quando entramos no consultório, o pediatra mal olhou para ele, mandou que fizesse o exame de sangue e falou para que voltasse na semana que vem! Duzentos reais por cinco minutos de atendimento! É por isso que as pessoas reclamam que a maioria dos médicos ignoram o juramento de Hipócrates. Agora é o juramento dos hipócritas!
Do sofá, Daniel choramingou. Adroaldo parou com seu monólogo e disse:
- Vou preparar uma mamadeira para ele. Você continua com a cara ruim, Mônica.
- Estou melhor.
Ela continuou sentada, massageando as têmporas, e Daniel estava imóvel a observando. Mônica fez uma careta e rosnou:
- O que tá olhando, pentelho? Nunca viu uma pessoa com dor de cabeça?
Sem ter entendido uma palavra que a mãe falou, Daniel riu. A vontade que Mônica teve foi de esganar o garoto para não vê-lo mais zombar dela.
Adroaldo voltou da cozinha com uma mamadeira. Testou a temperatura pingando uma gotinha nas costas da sua mão e depois entregou o Nescau ao seu filho. Ele enfiou as meias dentro dos sapatos e quando ia para o quarto de casal, lembrou-se de algo. Virou-se e disse:
- Você chegou a ver as pessoas na casa da portuguesa?
Mônica parou de massagear as têmporas e perguntou, desinteressada:
- Pessoas? Na hora do almoço?
- Não, agorinha a pouco - disse Adroaldo. - Tava chegando com Daniel quando vi dona Amélia e umas cinco pessoas no jardim da casa da Guiomar.
- Não... não vi...
Enquanto andava descalço para o quarto, Adroaldo disse:
- Deve ter acontecido alguma coisa...
(Ele sabe! Está te testando também!)

Continua...

No próximo capítulo: Mônica se junta aos vizinhos e vê a polícia investigando a casa de Guiomar. Dona Amélia conta como descobriu do assalto.

Rogerio de C. Ribeiro

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