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quarta-feira, 16 de julho de 2014

O PRÊMIO CAPÍTULO 28

No capítulo anterior: Giuseppe, um italiano de Nápoles, era dono de metade das bancas de jornais de Niterói e São Gonçalo. Conhecido pela sua rigidez nos negócios, era também impiedoso com funcionários inaptos. Seu lema era: "Vender fiado só para freguês antigo e só pode ser jornal, mas tem que pagar no dia seguinte. Se o freguês não tem dinheiro para ler jornal, ou ele lê as notícias na internet ou fica desatualizado com as notícias do dia!"
- E daí, Jorge?
- Ele percebeu que faltavam 110 reais no caixa. E o prazo que me deu para devolver esse dinheiro é hoje!
- Não posso fazer nada, Jorge. Não tenho dinheiro. Quem te mandou que vendesse fiado?
Antes que Jorge respondesse, ela passou por ele e caminhou para o ponto de ônibus.


Capítulo 28

Dessa vez entrou mais confiante no Banco do Brasil. Entrou em uma fila pequena e rapidamente sacou dois mil reais, que escondeu na sua bolsa a tiracolo. Atravessou a avenida e pegou o primeiro táxi que viu parado no ponto. Disse ao taxista:
- Rua Gavião Peixoto, por favor - Era uma rua no bairro de Icaraí.
- Sim senhora - disse o taxista, ligando o taxímetro.
Aconchegada no banco traseiro e desfrutando do ar-condicionado, Mônica pensou:
" Essa que é minha vida de verdade! Nada de ficar andando em ônibus lotados, aguentando a catinga daquele povinho suado... não! Com meu prêmio, vou ser madame, só andando em carro refrigerado..."
(E sua família, Mônica?)
"Esquece eles."
(Vou repetir... E sua família?)
"O que eles tem a ver com minha vida depois do prêmio?"
(Tem a ver porque são sua família!)
"Não vou pensar nisso agora! Quero aproveitar esse meu momento de liberdade..."
(Com sua família, não existirá liberdade!)
A dor de cabeça voltou com toda força. As têmporas pulsavam como se quisessem explodir. Mônica agarrou sua cabeça enfiando os dedos no cabelo oleoso.
- Esqueça deles! - Gritou Mônica.
O taxista olhou pelo espelho retrovisor e perguntou, preocupado:
- A senhora está sentindo alguma coisa, dona?
Controle-se, Mônica, não pode dar bandeira...
- Não é nada, desculpa... minha irmã ligou agora pro meu celular reclamando da nossa família... - Ela forçou um sorriso, e fingiu que fechava o fecho da bolsa para simular que tinha um celular ali dentro.
- É, dona, tem horas que é bom manter distância de parentes...
- Parente é serpente - disse Mônica e dessa vez riu com vontade. Até sua dor de cabeça deu uma acalmada.
O taxista também riu e disse, enquanto esperava o sinal de trânsito abrir para ele:
- Uma coisa que sempre digo pra minha patroa: Família é aquela que sempre está junta, nos bons e maus momentos. Pela minha patroa e meus filhos, dirijo quinze horas por dia para proporcionar o conforto que eles merecem.
- Mesmo? - disse Mônica, entediada com o rumo da conversa.
- Isso, dona. - Mônica olhou para a identificação do motorista. O nome dele era Evangivaldo Peçanha, e a foto mostrava seu rosto rechonchudo, com cabelos grisalhos e um largo sorriso estampado. Tinha jeito de ser extrovertido e simpático, e Mônica teve certeza que ele seria bastante útil ao que pretendia fazer.
- Sr... Evangivaldo...
O taxista soltou uma gargalhada:
- A senhora não precisa ficar envergonhada se errar meu nome, dona. Já tive passageiros que me chamou de Emarinhaldo, outro de Evangelista, alguns acharam que era Evanguinaldo. É um carma de carrego desde que meus pais quiseram homenagear com os nomes deles, Evangelina e Rivaldo. Deu no que deu, nessa salada mista!
Mônica disse:
- Ainda existem pais assim...
- Se tem!
- Evaninaldo... desculpa, Evangivaldo...
- Se quiser pode me chamar de Peçanha, dona, é mais fácil.
- É mais fácil mesmo - concordou Mônica, tentando parecer simpática. A pesada maquiagem que passou no rosto disfarçava suas olheiras e a cicatriz do arranhão debaixo do olho. Mas sua aparência ainda era cadavérica. - Sr. Peçanha, eu vou precisar ir em vários lugares, e se eu for pegar um táxi em cada ponto, acho que vou gastar mais dinheiro...
Peçanha esperou que ela finalizasse:
- Então pensei... - disse Mônica, - se o senhor podia me atender durante minha peregrinação pela cidade... claro que vou pagar o que der no taxímetro, é que não estou com muita disposição para andar de um lado ao outro...
Mônica percebeu que ele deu uma avaliada na sua passageira pelo retrovisor e pela cara que ele fez, realmente achou mesmo que ela não tinha a mínima condição de ficar andando.
- Sem problema nenhum, dona... só não entro em comunidades que estão em guerra...
- Onde vou, com certeza não tem nenhuma favela por perto...
O táxi entrou na rua Gavião Peixoto. Na primeira banca de jornais Mônica pediu para que ele parasse.
- Dona, eu não posso estacionar aqui...
- Finja que seu carro pifou - disse Mônica e agilmente, contrariando sua aparência doentia, abriu a porta. - Não demoro nem dois minutos.
Naquela banca comprou cinquenta pacotes de figurinhas. Voltou para o táxi e disse:
- Não disse que era rápido? Vamos em frente.
Mal o táxi andou cem metros, ela bateu no ombro do taxista e mandou:
- Pare ali!
- Dona, assim vou me encrencar! Essa rua é tomada de guardas municipais doidinhos pra multar...
- Com o prêmio que vou ganhar, vou pagar todas suas multas, Enagilvado!
O taxista acendeu o pisca alerta do carro e disse:
- Dona, só não demore muito...
- Me espera!
Cinco minutos depois Mônica voltou ao táxi, com mais 300 pacotes dentro da sua bolsa.
- E agora, dona?
- Vamos andando!
E foi assim em todo bairro. Ela passou em várias bancas de jornais e em cada uma delas comprou dezenas de pacotes. Mônica olhou o dinheiro que sobrara e decidiu fazer uma pausa.
Deu seu endereço e o táxi partiu para a zona norte. Quando o carro estacionou na esquina da sua rua, Mônica disse:
- O senhor pode parar aqui mesmo...
Ela pagou a corrida e depois atravessou a rua. Quando entrou em casa, eram quatro horas da tarde.

Continua...

No próximo capítulo: Mais uma vez Felipe é vítima das intrigas da voz na cabeça de Mônica.

Rogerio de C. Ribeiro

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