Translate

segunda-feira, 16 de junho de 2014

O PRÊMIO CAPÍTULO 12

No capítulo anterior: Mônica olhou as horas no despertador em cima da mesinha ao lado da cama. Dez horas. Dentro de duas horas e meia, Felipe e Mateus chegavam do colégio. Ela tinha que correr contra o tempo.
Andou naturalmente até a sala, e da posição onde se encontrava, atrás do sofá, não viu seu filho. Mônica pegou o travesseiro com as duas mãos, ergueu para o alto, e  se aproximou. Contornou suavemente o sofá e cantarolou:
- Mamãe te ama, querido... é para o seu bem...

Capítulo 12

Abaixou o travesseiro, mas parou. Largou o travesseiro como se tivesse levado um choque, e viu que Daniel dormia profundamente, enquanto chupava o dedo.
E sua mamadeira jazia caída ao seu lado, vazia.
Mônica suspirou aliviada, pegou Daniel no colo e levou para o berço. Olhou carinhosamente seu filho caçula, inocente, ressonando em paz, e sorriu. Saiu do quarto e fechou a porta. Marchou rápido para a sala. O relógio de parede marcava dez horas e vinte minutos. Em frente à porta da sala, havia um espelho oval pendurado, e ela viu sua imagem refletido nele.
Pela primeira vez, notou que seus cabelos castanhos, antes tão bonitos e sedosos, tinha adquirido bastante fios brancos e estavam oleosos. Sua pele, antes fresca e branca, havia se transformado em uma máscara pálida, seca, com riscos de pés de galinhas no canto dos olhos e rugas riscando ao  lado da boca. Embora continuasse magra como antes, agora era de uma magreza feia, com os seios murchos e os ombros caídos. Foi nessa mulher que acabou se transformando, depois de dez anos de casada e com três filhos pequenos. Nessa mulher insignificante, figura que não chamava a atenção de ninguém quando andava na rua. Perdera todo charme e sensualidade.
(Mas quando completar o álbum e vier resgatar seu prêmio, prometo que voltará a ser aquela Mônica jovem e bonita de sempre. Os homens vão babar e se ajoelhar diante de sua beleza, e as mulheres vão te invejarão. Em breve, minha querida, tudo vai ser como antes...)
Maldito espelho, pensou ela, enquanto saía para a rua.
Dez horas e vinte e cinco minutos. O sol escaldante torrava os miolos de Mônica enquanto ela caminhava em passos curtos até a casa de Guiomar. Por precaução, primeiro verificou se algum vizinho enxerido estava sentado na calçada ou regando as plantas. Pelo jeito, fugiram do sol e do calor escaldante da manhã. Estava com sorte, pensou, tudo conspirava a seu favor.
Parou em frente da casa de Guiomar, mais uma vez olhou para os lados da rua, viu que continuava deserta e abriu o portão, que nunca ficava trancado. Pisou macio com sua sapatilha no pequeno e bem cuidado gramado em frente à varanda. Subiu os quatro degraus e  diante da porta fechada, olhou atrás e os lados, certificando-se que não havia ninguém. Nem Champion, o vira-lata que perambulava nas ruas, deu sinal da sua presença. Bendito os quarenta graus, pensou.
Pôs a mão na maçaneta e um ouvido na porta. No outro lado, havia um absoluto silêncio no interior da casa. Ou Guiomar estaria na cozinha fazendo o almoço, ou em seu quarto, gelando seu imenso corpo no ar condicionado. Como era sovina, era bem provável que nem ar condicionado tivesse, e o que imaginou quase a fez soltar uma gargalhada insana: Imaginou Guiomar nua em pelo, deitada na sua cama, se refrescando com as pernas abertas, enfeitadas de varizes e artrose, com o vendaval de um ventilador turbinado. 
Lentamente, com muito cuidado, girou a maçaneta, mas para sua frustração, a porta estava trancada. Mônica, irritada, desceu da varanda. O modelo das casas que moravam eram iguais, então Mônica deu a volta e entrou pela lateral, onde tinha um portão que separava a varanda da área de serviços. Ela passou o braço por cima do portão e do lado de dentro puxou o ferrolho. Para sua sorte, estava sem cadeado. Abriu um espaço suficiente que conseguisse passar, e logo entrou na área, em meio de um varal com lençóis e toalhas pendurados. Atravessou as roupas de cama e se viu diante da porta da cozinha aberta. Mais uma vez, ficou impressionada com o bom gosto da lusitana. Moveu-se cautelosamente, procurou evitar qualquer ruído que alertasse sua presença na casa. Da cozinha deserta, chegou na sala, e ali também não tinha nenhum sinal da Guiomar. Parou ao lado da imensa tevê LED e de onde se encontrava tinha uma ampla visão do corredor que levava para os quartos e o banheiro. O silêncio era total, só interrompido pelo tic-tac de um antigo relógio cuco pendurado na parede no lado oposto que se encontrava.
(Vai ficar aí parada olhando o dia de ontem, porra?!)
Ela pulou assustada, e sussurrou:
- Espera um pouco...
(Se alguém passar na rua e pela janela, te ver aí que nem uma estátua, a merda vai feder feio para teu lado.)
Foi aí que Mônica viu a janela escancarada, que dava para a rua em frente. E ela bem visível para qualquer curioso que estivesse indo para a venda do Emanuel ou na banca do Jorge.
Entrou no corredor. As portas dos quartos estavam fechadas. A porta do banheiro, aberta. Mônica não podia andar sem que antes desse uma olhadinha para saber como era. Os azulejos eram brancos com tirinhas em azul claro, a privada marrom e a pia de alumínio. Viu o Box aberto e uma gigantesca ducha Lorenzetti.
Pra quê tanto luxo no banheiro? - Pensou. - Aposto qualquer coisa que nem banho direito ela toma. - Imaginou Guiomar e sua pelancada debaixo do chuveiro e fez uma careta de nojo. Saiu logo do banheiro, deu quatro passos no corredor e parou na primeira porta fechada. Respirou fundo, tomou coragem e abriu.
Era o quarto  de hóspedes, supôs Mônica. Mentalmente, memorizou a decoração: Uma cama de solteiro forrado com lençóis limpos, um criado mudo e sobre ele um abajur; um armário de quatro portas, um tapete ao lado da cama. Havia persianas na janela e estavam abertos, deixando que o sol da manhã iluminasse o ambiente. Uma penteadeira com quatro gavetas em frente da cama. Mônica entrou no quarto e fechou a porta. Abriu a primeira gaveta da escrivaninha e viu fronhas dobradas, separadas em cores e tamanhos. Na outra gaveta tinha meias e cuecas. Devia ter sido do falecido, pensou ela, enquanto abriu a terceira gaveta. Ali encontrou vários documentos. Eram certidões, escrituras de terrenos, recibos de aluguéis de vários apartamentos no centro da cidade. "Essa mulher tem mais grana que pude imaginar", pensou Mônica, revirando toda papelada.
Na última gaveta achou fotos antigas onde uma Guiomar jovem posava ao lado de um rapaz sério na praia de Icaraí, num tempo que ainda haviam casarões; outras fotos mostravam eles com a família reunidos ao redor de uma árvore de natal, outras fotos foram batidas no bar que ele tinha na Rua da Praia.
Mônica largou os retratos e fechou a última gaveta com raiva. Até agora só tinha encontrado quinquilharias nas gavetas. Nenhuma dica da fortuna escondida.
(Não pode esquecer de um detalhe, eles costumam, como hábito, de esconder seu rico dinheirinho debaixo do colchão...)
Mas é claro! Que melhor esconderijo senão debaixo do seu nariz? Enquanto tá roncando, fica sentindo o perfume da grana! Saiu do quarto e caminhou até outra porta, no final do corredor.
Abriu-a lentamente, e ficou surpresa que não houve nenhum rangido. O quarto estava envolvida pela penumbra, com a janela e persiana fechada.
Enxergou um vulto na cama de casal debaixo de um cobertor. O calor ali dentro era infernal, e o único ventilador sobre uma mesinha, estava desligado. Mônica visualizou algumas mechas de cabelo espalhados sobre o travesseiro, andou lentamente e parou ao lado da cama. Puxou o cobertor para baixo e viu Guiomar, com os olhos semicerrados.

Continua...

No próximo capítulo: O início do fim para uma pessoa...

Nenhum comentário:

Postar um comentário