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quarta-feira, 11 de junho de 2014

O PRÊMIO CAPÍTULO 10

No capítulo anterior: Mônica acariciou o conjunto de figurinhas que formavam o crânio, e mais uma vez teve aquela sensação que alisava um osso de verdade. Fechou o álbum, escondeu-o dentro do armarinho e voltou para a cama. Antes de pegar no sono, tinha uma ligeira impressão que se esquecera de algo.
Caiu em um sono profundo, sem se lembrar da sacola de plástico abarrotada de figurinhas repetidas que foi jogada ao lado da máquina de lavar.

Capítulo 10

Depois que Felipe e Mateus foram à escola e Adroaldo para a imobiliária, Mônica aproveitou para por seus pensamentos em ordem. Sentada no sofá com o pequeno Daniel no seu colo, o menino chupava o dedo polegar e via desenho na tevê. Mônica tinha seus olhos diretos na televisão, mas sua mente voava bem longe dali.
"Como vou entrar? A velha nunca sai da frente da casa, e quando sai, no máximo é para ir no Emanuel ou no Jorge. Se ela não está varrendo a calçada, fica enfurnada lá dentro. E como vou saber onde ela esconde o dinheiro?"
Não adiantava questionar nada, porque no momento havia Daniel. Ela observou seu filho caçula, que mostrava a ela como sabia dar cambalhotas no sofá, sem se machucar. Era mais um empecilho. Mais uma pedra no seu caminho.
Mônica deixou Daniel com suas cambalhotas, levantou-se e abriu a porta da sala. Olhou a rua deserta naquele momento e sentiu o calorão que já castigava logo cedo. Não eram nem nove horas e o lugar parecia o inferno.
"Ela deve estar em casa. Dona Guiomar nunca foi de aguentar o calor. Só pras quatro horas que ela sai para varrer a calçada..."
- Mama...Mama...
"E o Daniel, com quem posso deixar?"
Ela escutou a voz que vinha no seu lado:
(Larga o pivete no chiqueirinho e vá, aja logo!)
Mônica não se surpreendeu quando ouviu a voz. A sensação era que essa voz amiga sempre estivera ao seu lado, a voz doce e persuasiva de Damiano Lescarter.
- Não sei... com ele, toda atenção é pouca. Daniel tem predisposição de ficar enfiando os dedos nas tomadas pra ver se leva um choque ou não...
(Dopa o pestinha, assim ele apaga e você vai ter todo tempo do mundo para fazer o que precisa!)
Mônica virou-se. O seu filho tinha descido do sofá e andava, com as pernas arqueadas, em direção da televisão.
(Olha aí, é por causa dele que você não vai ter sucesso nenhum! Viva  Daniel, o grande responsável pela mediocridade da Mônica! Não é seu marido e nem os meninos maiores que atrapalham sua vidinha inútil. O nome para o seu fracasso se chama Daniel!!!)
- Ele é uma criança..
(Ele é o primeiro obstáculo para você superar. Se quer atingir seu apogeu, dê um jeito nesse pentelho agora!)
Daniel sentou-se no chão ao lado da televisão e pegou o fio que levava à tomada. Ele dava gargalhadas, enquanto balançava o fio. Estática, Mônica observava. Os olhos dela pareciam apáticos, bovinos.
(Já que não quer botar o pentelhinho pra dormir, então saia de casa, tranque a porta e vá logo para a casa da portuguesa. Deixa o moleque brincando um pouco com eletricidade... Se morrer torradinho, é menos um pra se preocupar...)
Mônica segurou a maçaneta da porta e chegou a dar um passo para a varanda, mas seu instinto maternal acordou-a do seu torpor. Voltou correndo, e pegou Daniel no colo.
- Não pode mexer no fio, Daniel! Dá dodói em neném. Vamos ver desenho.
Deixou o menino no sofá e disse:
- Mamãe vai fazer mamadeira bem gostosinha pro meu menininho. Fica aí sentadinho e bem comportado, que mamãe já vem!
Daniel bateu palmas e abriu a boca, onde alguns dentinhos enfeitavam as gengivas. Mônica foi para a cozinha.
Pegou a mamadeira, encheu de leite com Nescau e disse alto:
- Hummmm... Vai ficar tão gostoso...
Deixou a mamadeira em cima da mesa e saiu da cozinha. Obediente, Daniel continuava sentado com as pernas cruzadas em cima do sofá, e  batia palmas para ela.
- Peraí que mamãe esqueceu uma coisinha muito gostosa pro meu neném!
Ela caminhou até o banheiro, abriu as duas portas do armário sobre a pia e procurou o que queria. Mexeu nas escovas de dentes, esbarrou em um tubo de fio dental que caiu no chão, olhou alguns comprimidos e acabou encontrando: uma cartela de Mellodyn, um calmante que às vezes usava quando tinha insônia.

Continua...

No próximo capítulo: Não é tão fácil botar uma criança para dormir...

Rogerio de C. Ribeiro

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