Vera
acordou cedo naquele domingo ensolarado. Aurélio ainda roncava ao seu lado. Ela
se levantou e quinze minutos depois, foi ao quarto da sua mãe. Abriu a porta e
se assustou. A cama da sua mãe estava vazia e arrumada. Foi para a cozinha e
quando passou pela sala de jantar, viu a mesa posta para o café. Não eram nem
sete e vinte da manhã. Na época de Belinda, a mesa só ficava arrumada quando
faltavam cinco minutos para as oito da manhã.
"Espero
que não seja só fogo de palha! Já me disseram que nos primeiros dias a nova
empregada é como a gente sempre sonha, eficiente, alegre, disposta. Depois...
Por isso que muita gente não fica com uma empregada nova por muito tempo!"
Entrou
na cozinha; não tinha ninguém ali. Ouviu vozes vindo pela janela. Quando chegou
ali, viu Fernanda empurrando a cadeira de rodas com sua mãe no jardim
maltratado.
-
Bom dia - disse Vera, debruçada na janela.
Fernanda
acenou. O sol da manhã ainda era fraco e não fazia muito calor. Dona Vitória
usava um chapelão para proteger o seu rosto e um grande par de óculos escuros.
-
Sua mãe tá adorando o passeio! - Fernanda disse. Ela estava impecável no
uniforme. Mentalmente, Vera aprovou.
-
Como chegou aí com minha mãe?
Fernanda
protegeu os olhos com a mão direita enquanto olhava para a janela acima dela.
-
Deixei sua mãe sentada na cozinha, desci com a cadeira de rodas e depois subi
pra busca-la.
-
Nossa! Quanto empenho! São dez degraus!
Fernanda
sorriu. Parecia animada.
-
Ah! Fui ver a varanda da frente e não tinha sol. Aí descobri que o sol da manhã
bate primeiro no jardim. Isso faz bem pra dona Vitória. Vitamina D !
-
Vou descer.
A
porta da cozinha abriu e Vera desceu os dez degraus até o jardim. Dona Vitória
estava concentrada nos pardais, rolinhas, sabiás, que voavam das árvores até os
fios dos postes. A velha senhora levantou as mãos e acenou, como se estivesse
dando tchau para as aves.
Fernanda
estava sentada em um banco comprido de cimento e Vera se juntou a ela, sentando
ao lado. Realmente, o sol da manhã era agradável. Há quanto tempo que não ficava ali?, Vera pensou. Muitos anos.
-
Quando era criança, vivia aqui no jardim - disse Vera, nostálgica. - Papai tinha
um viveiro com mais de cem canários.
-
Devia ser uma cantoria de manhã - comentou Fernanda, embalando a cadeira de
rodas como se fosse um carrinho de bebê.
-
Ah, era mesmo! Mas às vezes irritava! Minha vontade era solta-los. Mamãe
ficava doida comigo! - Ela apontou para o canil abandonado. - Tivemos vários
dobermans. Papai adorava essa raça.
-
Jesus! Não eram brabos?
-
Brabíssimos. Mas é engraçado... naquele tempo eu não tinha medo. Nunca entrei
no canil, vivia trancado a cadeado, mas chegava bem perto e eles não faziam
nada.
-
E a senhora não quis ter mais cachorro?
-
Não! Dá muito trabalho. E ainda tem as crianças. Fico com medo de ter cachorro
brabo e que morda um deles. Não... Deixa como está.
-
A senhora tem razão. Mas esse canil abandonado também pode ser perigoso para as
crianças.
-
Eu sei disso. Estou para demolir essa construção, mas no momento não sobrou
dinheiro para isso.
-
Pra quê dinheiro, dona Vera? E seu Aurélio?
Vera
caiu na gargalhada.
-
Aurélio??? Se depender dele , a casa cai e ele continua lendo seu livro
sossegado. Não, pode esquecer, Aurélio não tem a mínima estrutura física para
levantar uma pedra!
Fernanda
comentou, encabulada:
-
Não sabia...
-
Menina, hoje é seu segundo dia aqui em casa. Espero que quando tiver dois anos aqui, continue sem sabendo de nada.
Fernanda
concordou. Olhou as horas no seu minúsculo relógio de pulso e disse:
-
Jesus Amado! Está quase na hora para o café da manhã!
-
Então vamos logo, estou morrendo de fome - disse Vera se levantando.
Vera
subiu a escada na frente, enquanto Fernanda subia atrás carregando dona Vitória no
colo. Deixou-a na cadeira da cozinha e voltou para pegar a cadeira de rodas.
Vera
se impressionou com a disposição da menina. Não demonstrou nenhum sinal de
cansaço. Pelo contrário; assim que acomodou dona Vitória na cadeira de rodas,
correu para ferver o leite e separar os pães que comprara de madrugada.
Vera
disse para si mesma:
-
Não vou ficar pensando se essa eficiência será para sempre. Se amanhã ela pisar
na bola, beleza, mando embora e chamo outra. Não existem mais Belinda que ficam
trinta anos em uma casa. Os tempos são outros...
*****************************
Para
desanuviar a cabeça depois que analisou o processo, Vera decidiu levar as
crianças para darem uma volta no Campo de São Bento. Perguntou se Aurélio
também iria, mas ele inventou uma desculpa esfarrapada, comentando que estava
cansado e ia dormir um pouco de tarde.
-
Conheço seu stress - comentou Vera, ironicamente. - Stress de tanto não fazer nada.
Enfiado
em uma poltrona na sala principal, Aurélio tinha o livro Cem Anos de Solidão na
mão. Baixou o livro e disse:
-
Não me venha com seus sarcasmos, Vera. Estou cansado e quero descansar.
-
Cansado de tanto coçar o saco, Aurélio! Vamos, fala que tô mentindo. Ou você
está correndo atrás dos clientes, visitando imobiliárias de peso e está me
escondendo tudo?
Ele
enfiou o livro na cara.
-
Nem pra passear com seus filhos você presta! Sempre tem uma desculpa pra ficar
em casa!
-
Vera... estou com minha cabeça explodindo de dor!
Anabela
entrou na sala com um bonito vestido rosa e rabo de cavalo.
-
Pai, vamos! - ela correu e abraçou Aurélio.
A
expressão no rosto dele era de desânimo.
-
Deixa pra próxima vez, filha...
- Traduzindo as palavras do seu pai, nunca, filha - zombou Vera.
-
... papai promete que te leva ao Campo de São Bento... - Aurélio preferiu
ignorar as palavras de Vera.
-
Anabela, desiste de ir com ele agora. Quem sabe, quando tiver 18 anos ele
queira...
-
Não é verdade! - Anabela gritou e agarrou o pescoço do pai com mais força. -
Papai prometeu e vai cumprir!
Nesse
interím Dequinha e Juninho entraram na sala. Como a irmã mais velha, Dequinha
vestia um vestidinho rosa e também estava com rabo de cavalo. Juninho estava de
camiseta e bermuda e um boné virado para trás. Ele puxou o rabo de cavalo da
irmã caçula e deu uma risada que era como um relincho, exibindo seus dentes amarelos
e cavalares.
-
Ai, mãe! Juninho tá me machucando!
Juninho
a imitou, fazendo uma voz em falsete:
-
Ai, mamãeeeeee! Meu irmão mais bonito do mundo tá puxando meu
cabeluuuuuuuuuuu!!!!
Vera
pegou sua bolsa e disse, secamente:
-
Juninho, não implique com sua irmã. E Dequinha, para de ser chata!
Vera
pegou as chaves do carro e quando as crianças saíram para a varanda, ela disse:
-
O pai de vocês está muito estressado! Tá precisando de umas férias!
Bateu
com a porta quando saiu. Aurélio largou o livro na mesinha ao lado e murmurou:
-
Uma hora explodo...
Fernanda
entrou na sala nesse momento. Ela carregava uma bandeja de prata com uma xícara
de café.
-
Com licença, seu Aurélio - disse Fernanda. - Acabei de passar um café.
Ela
foi se aproximando devagar, em passos miúdos. Deu a impressão que equilibrava a
bandeja com dificuldade. Solícito, Aurélio se levantou e disse:
-
Não precisa vir até aqui.
Ele
pegou a xícara e o pires e deixou em cima da mesinha ao lado. Fernanda baixou a
travessa e sorriu envergonhada. Suas faces estavam coradas, e pela primeira
vez, Aurélio notou que aquela criada era muito bonita.
Aurélio
teve uma sensação que há muito tempo não sentia. Não sabia explicar se era
pelos olhos amendoados e verdes da moça, do cabelo castanho puxado para trás em
um coque ou as gotículas de suor que porejavam na testa e no nariz sardento.
A
tarde era quente e a coitada devia estar derretendo na cozinha. A moça
desabotoou os dois primeiros botões do uniforme e o colo dos seus seios também
suavam.
Aurélio
percebeu que teve uma ereção espontânea. Tentou disfarçar, cruzando as mãos
displicentes na frente da bermuda. A moça não deu mostras que viu aquilo, tanto
que ela perguntou, gentilmente:
-
O senhor precisa de alguma coisa? Um copo d'água, um refresco...
-
Não... Nada - disse ele, com a voz seca. - Obrigado pelo café.
-
Vou ver como dona Vitória está e depois pego a xícara - disse ela, saindo da
sala.
Aurélio
arriou na poltrona, extasiado. Sua bermuda era como uma barraca armada. A
ereção continuava firme e forte.
"Meu
Deus! Como foi que Vera contrata uma garota bonita pra trabalhar aqui... Vai ser
difícil controlar a tentação..."
Enquanto
ia para a cozinha com a bandeja, Fernanda ria. O patrão ficou de queixo caído! O instrumento dele não era grandes coisas, mas ela adorava excitar os homens.
Principalmente, apreciava em saber que os homens a desejavam. Seu
ego aumentava.
Continua...
No próximo capítulo: Fernanda faz uma vistoria no quarto de Dona Vitória e encontra algo interessante.
Rogerio de C. Ribeiro
Continua...
No próximo capítulo: Fernanda faz uma vistoria no quarto de Dona Vitória e encontra algo interessante.
Rogerio de C. Ribeiro
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