- Acha mesmo?
- Acho. Dona Vera é uma mulher de sorte.
Aurélio não aguentava mais. Agora acariciava a nuca da empregada.
- Esquece dona Vera - disse com voz rouca. - Finja que ela não existe.
Puxou-a contra si e beijou-a como há muito tempo não beijava nenhuma mulher.
-
Não amo, mas gosto dele - disse Vera, com sinceridade. Rodrigo a observava
quieto, pensativo. - Aurélio tem muitos defeitos, mas é bom pai, leal a mim e
sempre me apoiou. Quando papai faleceu, ele ficou no meu lado o tempo todo.
-
Seu pai foi muito importante na sua vida. Lembro que no colégio você enchia a
boca quando falava dele.
Os
olhos de Vera marejaram com a lembrança do pai. Balançou a cabeça e disse,
saudosa:
-
Meu pai foi tudo para mim. O verdadeiro exemplo de como um homem deve se
portar, com honestidade, caráter, justiça.
-
Lembro vagamente dele nas campanhas.
-
Meu pai era idolatrado pelo povo. Pena que a memória desse mesmo povo seja
curta.
-
E seu marido? Ontem, você não parecia muito animada com sua situação.
-
E não estou mesmo. Mas hoje houve um sopro de esperança.
-
Como assim?
-
Quando acordei, Aurélio já tinha saído de casa bem cedo...
-
E você acredita que ele foi procurar trabalho ou...
-
Ele nunca saiu de casa tão cedo.
Rodrigo
acariciava a mão de Vera e ela deixava. Ele perguntou:
-
E eu?
-
Que tem você? - disse ela, secamente.
-
Pensei que estivesse atraída por mim...
-
E estou, senão não estaria aqui em plena manhã com uma tulipa na minha frente -
disse ela sinceramente, apontando para a tulipa ainda cheia de chope. - Mas ainda
sou casada com ele, e não posso tomar uma medida drástica com que venha me
arrepender depois.
-
Você disse que ele é leal a você...
-
Por ele, boto a mão no fogo - respondeu com toda certeza.
********************
-
Não, seu Aurélio - disse Fernanda, se afastando do patrão. Estava descabelada e
os grampos do coque pendiam em alguns fios soltos.
-
Por quê? - Reagiu Aurélio, a agarrando pelos braços e puxando-a contra si.
-
Eu... eu não posso... - disse a moça, atordoada. - Não é justo! O senhor é
casado com dona Vera...
-
E daí? - disse Aurélio, lascivo. Ele suava e seu coração disparava feito louco.
- Não gosta de mim?
Fernanda
fechou os olhos e admitiu:
-
Meu sentimento não importa...
-
Pra mim importa e muito!
-
O senhor é tão bonito... cheiroso... sabe fazer uma mulher feliz...
Aurélio
riu.
-
Nem tanto, meu amor. Meu casamento não anda tão bem como pensa.
Fernanda
arregalou os olhos.
-
Não acredito! Dona Vera parece ser tão apaixonada pelo senhor!
-
Deve estar apaixonada por ela mesmo. Eu sou infeliz, Fernanda - E ante o olhar
piedoso da moça, completou: - Pensei em sair de casa várias vezes, mas o que me
prende aqui são meus filhos.
-
Como pode... Se tenho um marido como o senhor, agradeceria todo dia pela minha
sorte!
-
Vera não pensa assim...
********************
-
O que pretende fazer a isso, Vera? Não quero que você pense mal de mim, mas não
acredito que seja tão conformista por causa de lealdade.
-
E não sou mesmo, Rodrigo. Antes de tudo, prezo minha autoestima.
-
Posso te perguntar uma coisa?
Vera
sorriu.
-
Do jeito que te vi ontem me deu a impressão que já tinha chutado o balde. Por
isso te beijei.
-
E gostei. - disse Vera, acariciando a mão de Rodrigo. - É muito bom quando você
desperta o interesse em alguém, prova que ainda estou viva para o mundo.
-
Não quero que pense...
-
Não penso nada, Rodrigo. Mas quero um tempo. Não quero entrar numa aventura
só pra mostrar depois ao meu marido que outro homem me deseja.
Rodrigo
balançou a cabeça e disse:
-
Eu espero.
-
E além do mais, quero conversar com Aurélio antes. Eu não quero sacanea-lo. Ele
não merece isso.
********************
-
Desde a primeira vez que te vi, te desejei - disse um sôfrego e ansioso Aurélio.
Fernanda continua sentada, com as pernas coladas uma à outra, olhando para as
mãos.
-
Não fale assim, seu Aurélio...
-
Me apaixonei por você - mentiu Aurélio.
Fernanda
mostrou surpresa com a declaração mentirosa do idiota do punheteiro e disse,
com um leve sorriso nos lábios:
-
Mesmo?
-
Sim, Fernanda!
-
Não quero que minta pra mim, seu Aurélio... Eu sou ingênua... Já caí na lábia
de muitos malandros...
-
Eu não sou nenhum malandro!
Fernanda
se levantou e disse:
-
Já me magoaram muito... eu não sei...
Aurélio
tomou a decisão. Dane-se se ela ia processa-lo depois.
-
Quero transar com você!
Fernanda,
indignada, disse:
-
Transar?
Aurélio
consertou:
-
Não... desculpe... quero fazer amor com você!
Fernanda
conseguiu fisgar o paspalhão de pau pequeno. Mas ia atiça-lo mais ainda. Se
cedesse, ele desistiria dela depois.
Ele
tinha que ficar de quatro para ela. Só assim, haveria uma chance de embolsar a
grana que ele ia ganhar!
-
Tenho que fazer o almoço, seu Aurélio...
-
Me espera de noite... quando Vera cair no sono, venho no teu quarto.
Fernanda
não disse nada e Aurélio aceitou isso como uma resposta positiva. Antes de sair
da cozinha, disse:
-
Vou te ensinar o que é ter uma noite de amor, Fernanda.
Depois
que ele saiu, Fernanda pensou:
"Quem
vai te ensinar uma coisa sou eu. Mas não hoje, queridinho. Quero te ver melando
a cueca antes..."
Continua...
Rogerio de C. Ribeiro
Continua...
Rogerio de C. Ribeiro
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