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terça-feira, 12 de maio de 2015

A CASA AMARELA CAPÍTULO 2

I
Eles passaram pelo arco e caminharam pelo corredor, onde a moça de uniforme branco e sorridente os aguardava. Ela  apontava para as portas fechadas e dizia:
- Esse é seu quarto, Jorge, e aqui...
Foi orientando todos.
Dentro do quarto, Jorge viu uma cama de solteiro, uma pequena mesa ao lado e uma janela aberta que dava para a frente da casa. Era um quarto simples, muito parecido com aquele que dormia na chácara dos seus avós.
- Só espero que não tenha errado quando vim para cá.
Deitou na cama, sentindo o colchão de palha massageando suas costas.Até o cheiro da palha era igual à cama que dormia quando era criança. A cama não era forrada com lençol e nem tinha travesseiros, mas isso não fazia falta. De repente descobriu que estava cansado, um cansaço que nunca sentira antes na vida. Fechou os olhos e buscou algum som lá no jardim, mas novamente só ouviu o silêncio absoluto. E sem perceber, caiu no sono profundo sem sonhos.

II
Célia Bangstorm ficou paralisada quando entrou no quarto que lhe destinaram. Ela que sempre gabara da sua perfeita saúde, que sua pressão nunca subira ou descera, teve que se conter para não desabar no chão.
O que era aquilo? Que quarto era esse?
Célia não acreditava o que tinha diante dos seus olhos.
- Esse quarto... - ela disse num suspiro de voz - esse quarto é idêntico, uma cópia fiel, do quarto que tive quando tinha... tinha...
Não lembrava agora que idade tinha, mas fazia muito tempo com certeza.
E como era possível que nessa casa, lugar que nunca pisara antes, tivesse um quarto que foi destinado a ela, igual ao que teve na época que ainda era solteira?
A cama de solteiro tinha a cabeceira de madeira envernizada e colchão de molas. Ao lado, um criado-mudo com um abajur rosa, idêntico do presente que ganhou do seu pai. Era um quarto simples, pobre, mas antes de ser a senhora Bangstorm, sua vida não era nem um pouco luxuosa.
Esse tempo de escassez ela fez questão de apagar das suas memórias. E agora diante dela parecia que esse tempo reclamava pela lembrança.
Célia sentou-se na beirada da cama e até a sensação da maciez do colchão era a mesma.  Ela se recusava em deitar ali. Não podia. Não queria.
Mas o cansaço falou mais alto e tomou conta do seu corpo. Logo estava deitada mesmo sem o travesseiro de penas de ganso que costumava usar, e logo fechou os olhos e emergiu num sono profundo.
III
O quarto lembrava bastante ao primeiro quarto de motel que fora com seu noivo. Pelo menos a cama era parecida, Michelle pensou quando se aproximou do móvel. Era uma cama larga, sem lençol, e o colchão era macio e afundava com seu peso.
Sentia falta do cigarro entre os dedos, da fumaça queimando sua garganta, da nicotina correndo sua corrente sanguínea, mas ficou surpresa que dessa vez não estava tendo um acesso de abstinência como acontecia antes quando ficava sem cigarros. Tinha vontade de fumar sim, mas era uma vontade insossa, longínqua.
Até que horas ia ficar nessa casa? Nunca gostou de se atrasar em um compromisso marcado. Imaginou seu celular tocando várias e várias vezes escondido dentro da bolsa. E mensagens dos clientes irados pelo seu atraso.
Uma ideia passou pela sua cabeça e quis afasta-la para bem longe. E se esqueceu a bolsa em casa? O risco era se o celular tocasse e sua mãe ou seu pai abrisse a bolsa para atender a chamada. E ali ela guardava sua caderneta com os nomes dos clientes fieis. O que seus pais pensariam disso?
- Nem quero pensar - ruminou enquanto se deitava naquele macio colchão.
Por mais que tentasse explicar os verdadeiros motivos, seus argumentos dissipariam feito vapor aos ouvidos dos velhos. Por isso esperava que tivesse deixado a bolsa em outro lugar, até na casa de um cliente se fosse o caso.
- Não vou sofrer por antecedência - Michelle murmurou antes que caísse em um sono pesado.
IV

A primeira coisa que ele fez quando entrou no quarto foi conferir se a janela estava bem fechada. Para seu desespero, a janela estava aberta e pior, não tinha nenhum vidro para proteger dos ventos.
Sílvio correu de volta para a porta do quarto mas no instante que tocou na maçaneta, sentiu calor. Muito calor.
Largou a maçaneta e suspirou aliviado. Mesmo que a janela fosse apenas um quadrado escancarado para o lado da casa onde via um mar verde de mato, se estivesse ventando lá fora pelo menos não entrava ali.
Isso era bom. Sempre dizia para sua mãe que com saúde não se brinca. E como sabia que sua saúde era bem frágil, ele sempre procurou auxílio dos médicos para que descobrissem qual doença tinha.
Pelo menos agora se sentia mais protegido dentro da clínica. Finalmente entenderam que sua saúde era péssima e que precisava de um tratamento bem rigoroso.
O quarto era simples, tinha apenas uma cama e uma mesinha ao lado. Estranhou que não houvesse nenhum remédio na mesa, nem um simples comprimido para dor de cabeça. Julgou que a enfermeira viesse depois com os medicamentos;afinal, mal chegara na clínica e o doutor ainda tinha que ler nos relatórios que tipo de remédio podia administrar.
Deitou-se no colchão ortopédico, ótimo para sua coluna atrofiada, e cruzou os dedos em cima do peito. Logo a enfermeira vem com meus remédios, logo vou ser medicado corretamente, logo o médico vai dar seu diagnóstico, logo...
Caiu no sono.
V
O quarto estava escuro e encoberto por uma penumbra cinzenta. Horácio procurou o interruptor de luz, mas não encontrou em nenhum lugar naquelas paredes descascadas.
Além da penumbra, o quarto cheirava mal. Horácio foi até a janela aberta e inspirou o ar no lado de fora, mas não adiantou muito, ali também fedia.
A primeira providência que tomaria quando saísse do quarto seria fazer uma queixa formal a respeito daquele aposento sujo. A vista foi se acostumando com a escuridão e distinguiu teias de aranhas e buracos nos rodapés. Ratos, aranhas e com certeza baratas. Onde foi se meter.
Mas se eles achavam que ia desistir e ir embora da casa estavam completamente enganados. Não era um cheiro ruim ou insetos que o assustaria. Não...
Por que já passou por isso uma vez e sobreviveu.
Sentiu o corpo pesado, cansado. Engraçado, quando chegou na casa não se sentia tão cansado como agora. Provavelmente era o calor que fazia ali dentro. Pela janela escancarada não entrava nenhuma brisa. Via somente o jardim esturricado e o céu da cor de chumbo, mas sem nenhuma nuvem carregada.
Decidiu deitar um pouco naquela velha cama, e o contato dos estrados nas suas costas não o incomodou. Mesmo deitado arfava como estivesse correndo.
Sentiu o peso nas pálpebras e logo fechou os miúdos olhos e caiu em um sono pesado, sem sonhos.
VI

A alegria tomou conta de Simone quando viu seu quarto decorado com vários buquês de flores espalhados pelo aposento.
Quando chegara na casa já tinha tido a alegria de ver uma alameda florida e agora algumas flores do jardim estavam ali para recepciona-la.
E a cama... Simone pôs as mãos na boca para abafar o iminente grito. Centenas de pétalas de rosas brancas enfeitavam o colchão, e o perfume emanava no ambiente.
Tudo era um sonho, mas um delicioso sonho, pensou ela enquanto deslizava para a cama e se embrenhava nas pétalas, esfregando no rosto e nos braços. Uma vez sonhou que o noivo fazia essa surpresa para ela na noite de núpcias e esse agora o sonho era realidade.
Para que tudo ficasse perfeito só faltava o canto dos passarinhos, mas mesmo com o céu azul sem nuvens e o sol brilhando, o silêncio lá fora era perturbador.  
Não sabia por quanto tempo permaneceria na casa, mas só esses momentos mágicos bastariam para que se lembrasse para sempre dessas maravilhosas horas que esteve ali. Quando ela e seu futuro marido estivessem bem velhinhos, contaria aos seus netos e bisnetos da casa amarela, o lugar que descobriu sua felicidade.
Emaranhada de pétalas das rosas brancas pelo corpo inteiro, Simone pegou no sono e dormiu com um sorriso nos lábios.
VII
- Eles estão dormindo, Doutor - a moça de uniforme branco comunicou.
- Eu sei - comentou o Doutor. Os dois estavam em um aposento de paredes brancas onde só haviam duas cadeiras, uma em frente da outra, de mobília. A porta do aposento estava aberta e mostrava o corredor com seis portas fechadas. - A partir de agora algumas coisas vão acontecer com eles, e é claro que ficarão confusos.
- Mas o Doutor vai ajuda-los - disse a moça sorrindo.
O Doutor também sorriu.

- Claro que vou ajuda-los. É para isso que estou aqui. 

Continua...

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